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DISCURSOS

DISCURSO PROFERIDO POR DAGOBERTO DE CASTRO BRANDAO EM 
4 DE DEZEMBRO 2009 POR OCASIÃO DE SUA POSSE COMO ACADÊMICO TITULAR  DA ACADEMINA NACIONAL DE FARMÁCIA SEÇAO MEDICINA.

Acadêmico Caio Romero Cavalcanti
DD Presidente da Academia Nacional de Farmácia
Acadêmico Lauro Moretto
Secretário Geral da Academia Nacional de Farmácia, pessoa na qual saúdo os demais componentes da mesa
Gilberto de Nucci e Marcio Falci que também tomam posse hoje como acadêmicos titulares neste sodalício.
Acadêmicos da Academia Nacional de Farmácia aqui presentes
Meus senhores e minhas senhoras
Caros amigos, colegas e  convidados
Minha querida esposa Alaide, meus queridos filhos

 

Em reunião realizada no dia 18 de setembro de 2009 a Academia tomou ciência dos pareceres dos acadêmicos, através de sua Presidência, referentes à minha pretensão endereçada pelo ilustre Acadêmico Lauro Moretto, de ocupar uma vaga de membro titular da seção de Medicina da Academia Nacional de Farmácia. Ao final da reunião foi aprovado o meu ingresso por unanimidade. 


Fui informado algum tempo depois desse fato, bem como que iria ocupar a Cadeira de número 95, da seção de Medicina dessa Academia e que tem por patrono o Prof. Dr. José Messias do Carmo, tendo sido seu último ocupante o Dr. Júlio Rocha do Amaral. Não preciso descrever a emoção que senti ao receber essa maravilhosa notícia. Era a realização de um sonho jamais sonhado por achá-lo impossível de merecê-lo e, paradoxalmente, um sonho sempre sonhado por considerá-lo a realização plena de uma carreira.


Já sabia que a Academia Nacional de Farmácia é uma associação civil científica fundada em 13 de agosto de 1937, tendo como sede a cidade do Rio de Janeiro. E que seus principais objetivos incluem: 


- Estudar, debater e divulgar tudo o que relacione com a Farmácia e as ciências afins bem como promover iniciativas e medidas que visem ao aprimoramento cultural e tecnológico da Farmácia e das atividades profissionais a ela relacionadas. 


Já sabia também que a Admissão de Membros Titulares é feita por eleição em escrutínio secreto após julgamento feito por uma comissão de três membros especialmente nomeados pelo Presidente da Academia. E que o postulante, para ocupar a cadeira de Acadêmico Titular, deveria preencher algumas condições tais como:


a) Ser brasileiro; b) ser formado em Farmácia, Medicina, ou Odontologia por tempo não inferior a 15 anos; c) apresentar memória ou trabalho inédito de lavra própria; d) possuir atividade científica-profissional comprovada com a apresentação dos seus títulos e trabalhos. E que o dever fundamental do Acadêmico é prestigiar a Diretoria e zelar pelo progresso, decoro e renome da Academia, pugnando pelo seu engrandecimento e cultivando o sentimento da fraternidade para com seus pares.


A cadeira nº 95 que irei ocupar tem como Patrono o eminente Farmacêutico e Médico, Prof. Dr. José Messias do Carmo.


José Messias do Carmo era natural da cidade de Caruaru, Pernambuco, onde nasceu aos 31 de agosto de 1899. Ali realizou o curso de primeiras letras transferindo-se posteriormente para o Rio de Janeiro, onde completou todo o curso secundário no Colégio Pedro II. Iniciou sua vida de trabalho como marinheiro, integrando a Marinha de Guerra do Brasil. Graças a seus esforços excepcionais em que utilizava as horas de folga, conseguiu fazer o curso de Medicina e de Farmácia. 


Muito tempo depois, transferindo-se para o quadro de reserva da Marinha, José Messias do Carmo dedicou-se ao magistério, função que exerceu com muita a dedicação e brilhantismo. Foi Professor Livre–Docente em Higiene e Medicina Preventiva da Faculdade de Farmácia da Universidade do Rio de Janeiro. Foi também professor de vários cursos da Escola de Enfermagem e do Instituto de Ensino Especializado da Escola de Saúde Publica de Manguinhos. Neste período de sua vida tornou-se membro titular da academia Nacional de Farmácia da qual também exerceu vários cargos de Diretoria bem como foi membro titular da Academia Nacional de Medicina – seção de Farmácia, da qual foi presidente; foi discípulo de Irineu Malagueta na celebre 14ª Enfermaria da Santa Casa de Misericórdia. 


Este ilustre Professor, patrono da cadeira que agora ocupo, foi fundador de várias entidades, destacando-se a Sociedade Brasileira de Nutrição. Recebeu o titulo de Carioca Honorário que lhe foi entregue em solenidade cívica pelo Almirante Amaral Peixoto. José Messias do Carmo foi um famoso e competente médico sanitarista, especializado em doenças infecciosas transmissíveis, sendo pioneiro dos estudos da nutrição do Brasil. José Messias do Carmo faleceu em 04 de fevereiro de 1981, deixando para todos nós o exemplo de um homem e um profissional que ilustra e honra a classe médica e farmacêutica Brasileira. 


Na verdade sem que eu pudesse imaginar que seria ocupante de uma cadeira da Academia Nacional de Farmácia estive com José Messias do Carmo em 1972 discutindo com ele caminhos da pesquisa de novos produtos farmacêuticos à base de vitaminas, sais minerais e princípios ativos de plantas medicinais diversas. Sem que eu soubesse começava ali a minha busca para obter novos produtos derivados de plantas medicinais.


Já dizia Hipocrates no ano 390 a.C:


“ Não há porque envergonhar-se de tomar do povo o que pode ser útil à arte de curar.”


Na pré-história, ao observarem o hábito dos animais, os humanos provavelmente começaram a manipular e usar as plantas para aliviarem os sintomas de moléstias e ferimentos. O homem de Neanderthal já utilizava uma “pequena farmácia” com oito plantas medicinais.
A busca e o uso de plantas com propriedades terapêuticas é uma prática multimilenar, atestada em vários tratados de fitoterapia das grandes civilizações há muito desaparecidas.

 

Se Hipócrates foi considerado o pai da Medicina, Dioscórides, sem qualquer dúvida, é o pai da fitoterapia. Embora Dioscórides fosse considerado a absoluta autoridade em “matéria médica” durante mais de 1500 anos, é importante notar que o conhecimento do uso de plantas medicinais foi passado de uma geração a outra, não pertencendo a nenhum indivíduo, mas a toda humanidade.


No Brasil, a fitomedicina teve influências das culturas indígena, africana e européia. Os portugueses, quando chegaram ao Brasil, encontraram grande diversidade de plantas em uso pelas diversas tribos que aqui viviam. O conhecimento indígena foi importante para ampliar o uso de plantas medicinais pelos colonizadores.


No final do século XIX , o Farmacêutico José Ribeiro Monteiro da Silva tornou-se conhecido e admirado por seus estudos sobre plantas medicinais.  Monteiro da Silva nasceu em 1863, em Mar de Espanha, Minas Gerais. O período entre 1887 e 1912, data em que fundou o laboratório Flora Medicinal, foi de intensa dedicação ao estudo das plantas medicinais. Em 1905, o doutor Monteiro da Silva, em parceria com o botânico Wenceslau Bello, foi incumbido de elaborar uma monografia, sob o título "Indústria Extrativa – Reino Vegetal". Monteiro da Silva não se concentrou apenas em compilar e destacar as características da flora brasileira.  Sua atuação principal consistiu em avaliar as propriedades de plantas medicinais já conhecidas e utilizadas popularmente. Procurou, acima de tudo, estabelecer um liame entre o trabalho dos cientistas e dos acadêmicos com a população.


A Fitoterapia tem evoluído ao longo dos tempos desde as preparações mais simples até as formas farmacêuticas tecnologicamente sofisticadas utilizadas pelo homem moderno. 


A busca por novos fitoterápicos acabou estimulando a pesquisa pré – clínica e clínica das nossas plantas medicinais, fortalecendo a confiabilidade na eficácia e segurança de uso destes produtos. 


Do ponto de vista fitoquímico e desenvolvimento galênico, a história desses produtos evoluiu das tinturas, chás e outras formas afins para o extrato padronizado com frações e subfrações perfeitamente identificadas. 


A revolução na história da Fitoterapia no Brasil ocorreu em 1995, quando o Prof. Elisaldo Carlini, então Secretário da Vigilância Sanitária, fez publicar a Portaria 06/95. Esta norma trouxe os fitoterápicos para o terreno do embasamento científico de tal maneira que eles não poderiam mais se distinguir dos produtos sintéticos a não ser pela origem. A Portaria 06/95, muito avançada e rigorosa, exigia de todos os produtos registrados e não registrados a comprovação clínica da eficácia e da segurança de uso. Foi substituída pela RDC 17/2000, que trouxe outras opções de registro, porém mantendo e preservando o conceito do embasamento científico e do controle de qualidade desses produtos de acordo com o enfoque pioneiro da Portaria 06/95. Em abril de 2004, foram publicadas as RDC 48/04, REs 88/04, 89/04, 90/04 e 91/04 que revogaram a RDC 17/00 e modernizaram, de maneira importante, a questão regulatória dos fitoterápicos. O grande mérito dessas normas foi concentrar as exigências e requerimentos técnicos nos fabricantes dos produtos e, em conseqüência, assegurar a qualidade dos medicamentos fitoterápicos.


A história de uma civilização e suas conquistas jamais terá um fim. Todavia existem pontos de destaque que irão ficar para as futuras gerações.  Um destes destaques foi a pesquisa e o desenvolvimento do anti-inflamatório de uso tópico à base da Cordia verbenácea (cujo nome popular é “erva baleeira”) realizados inteiramente no Brasil, envolvendo centenas de pesquisadores, igualmente brasileiros. Esta inovação representa um verdadeiro marco na história contemporânea dos fitoterápicos no Brasil. Este fitomedicamento foi alvo de um programa fantástico de pesquisa e desenvolvimento que consumiu mais de 10 milhões de reais e mais de dez anos considerando as primeiras tentativas preliminares. Em 1998 começou novo programa de pesquisa que, após seis anos, produziu um poderoso anti-inflamatório com mecanismo de ação inovador. Foi isolado o princípio ativo e o mesmo foi patenteado no Brasil e no Exterior. A história da fitomedicina no Brasil será dividido em antes e depois da descoberta deste fitoterápico inovador e totalmente desenvolvido no Brasil, exclusivamente por pesquisadores brasileiros. 


Deve-se ressaltar que por meio do programa de Plantas Medicinais da UFSC, sob a coordenação do Professor João Batista Calixto, foi possível a interação com várias indústrias farmacêuticas, tanto em nível nacional como internacional. Esta parceria fez possível diversos estudos “in vitro e in vivo” no sentido de obter frações, subfrações e fitofarmácos e melhor caracterizar os seus mecanismos de ação. Outro projeto da CEME foi desenvolvido por Carlini e colaboradores. Esse projeto consistiu na pesquisa e no desenvolvimento de um fitoterápico à base da M.Ilicifólia. A Unifesp através de CARLINI, KOHLMANN, LAPA , PARISE e SCHOR, tem trazido enorme contribuição para a Fitoterapia através de estudos com diferentes plantas medicinais brasileiras. Nesse mesmo sentido, diversas outras Universidades do Brasil, em interação com os departamentos de P&D da indústria farmacêutica nacional, implantaram programas de pesquisa e desenvolvimento de novos Fitoterápicos. A título exemplificativo e não exaustivo, podemos citar os grupos de AFIUNE, BONFIGLIOLI, BRAGA, BRANDÃO, CHANEL, FERREIRA, FARIAS, GARCIA, LEVY, LAZZARINI, MIRANDA, MOURA, MORAES, PAGANI,PIANOWSKI, RIBEIRO, SHARAPIN, SUAREZ – KURTZ , VERGNANINI e WONG. 


Estamos, no atual momento, vendo florescer novamente a fitoterapia brasileira. Neste sentido, temos maior confiança na utilização de fitomedicamentos, compostos por extratos padronizados.  


As novas gerações irão escrever sobre a nossa história destacando que “... no início do século XXI o Brasil retomava o caminho que o levou a ser, atualmente, uma nação pujante e soberana dentro da Medicina”.


A História mostra que o uso dos fitoterápicos esteve presente em todas as civilizações e em todos os tempos, sempre trazendo grandes benefícios e facilidades de acesso. Não há dúvida que este fato, somente encontrado na Fitomedicina, também se repetirá nos próximos milênios. 
“Ervas e arbustos que enfeitam árvores, campos e margens dos caminhos são tesouros valiosos para a medicina que poucos olhos vêem e poucas mentes compreendem. Por causa deste descaso toda a humanidade sofre imensa perda”.


Carl von Linneus
(1707 – 1778)

Não poderia encerrar meu pronunciamento nesta solenidade tão importante da minha vida sem fazer agradecimentos: Primeiramente agradeço aos meus saudosos pais que me deram a vida, agradeço ao Grande Arquiteto do Universo e todos os meus ilustres colegas da cirurgia cardíaca da Cardiologia, da Nefrologia, da Hemodiálise do Hospital Sírio Libanês, que me permitiram continuar a viver.


Um agradecimento especial à minha querida esposa Alaíde, minha companheira fiel e guerreira que, acreditando nos meus sonhos, ajudou-me a torná-los realidade.


Agradeço a Roberto, Vanessa, Rodrigo e Evelise, meus queridos filhos que são sempre a força que me mantém na luta e na vontade de cada vez crescer mais.


Agradeço a todos os colegas, colaboradores e ex-colaboradores da PHC e da Medinfar que me deram o exemplo, o estímulo e o suporte em toda a trajetória da minha carreira. Agradeço especialmente a Lauro Moretto pela indicação do meu nome.


Finalmente agradeço a Victor Siaulys, meu inesquecível amigo. 


Victor Siaulys deu-me muitas chances, sendo a maior delas a oportunidade, a honra e o privilegio de participar de um grupo fantástico, que desenvolveu o medicamento anti-inflamatório derivado da Cordia Verbenácea.


Existem dois verbos que aprendi a conjugar com Victor Siaulys, na minha vida profissional, e estes dois verbos são: OUSAR e INOVAR.
Victor Siaulys mais do que ninguém foi um homem de muito sucesso e as suas vitórias pessoais, profissionais e de grande empresário, e sempre tiveram como princípio a ousadia e o espírito inovador.


Victor Siaulys faleceu aos dezenove de março de 2009, mas deixou para todos nós, e especialmente para mim, o exemplo de um homem batalhador, incansável e, sobretudo do verdadeiro espírito de fraternidade e de responsabilidade social que todos nós devemos ter.


Termino as minhas palavras, pedindo ao Grande Arquiteto do Universo que cubra-me de bênçãos e que me ilumine por todos os caminhos que irei percorrer, em todos os momentos pelo resto da minha vida.   


Muito Obrigado!